Era domingo. O clube estava cheio. Sentei em uma das poltronas de plástico da cafeteria (estranha, mas confortável). Havia combinado de encontrar minha esposa no portão de saída. A cafeteria era aberta e tinha vista direta para o portão.
Vários grupos de pessoas preenchiam o ambiente ensolarado. Famílias, amigos, esportistas, etc. A música pop bombando em meus ouvidos (através de um fone de ouvido bluetooth) fazia o mundo dançar feito um videoclipe da Madonna.
Após alguns minutos de espera, minha esposa apareceu no portão de saída. Levantei e fui ao seu encontro, usando o caminho dos fundos, que passava por trás do quiosque da cafeteria. Foi nesse momento que vi Isaura e a música pop parou.
Não conheço Isaura. Não sei se Isaura se chama Isaura. Creio que não. É mais provável que Isaura se chame Iasmim, ou algum outro nome moderno. Batizei Isaura com esse nome por acreditar que ela faz parte da senzala do clube e não da casa grande.
Isaura estava sentada no chão atrás do quiosque da cafeteria. Aliás, escondida atrás do quiosque. Pescoço curvado e cabeça afundada no celular, feito um avestruz. Ver essa cena, que contrastava em gênero, número e grau com a anterior, me impressionou.
Mas Isaura fez algo mais impressionante. Algo que nem ela esperava fazer. Isaura olhou nos meus olhos. E tão logo percebeu que eu também estava olhando para ela, curvou o pescoço novamente e voltou a enfiar a cabeça dentro do celular.
Arrisco dizer que o celular de Isaura era fake. Não funcionava. Servia apenas como escudo de invisibilidade. “Se eu não olhar para ninguém, permanecerei invisível”, Isaura pensava. E o escudo funcionou até que peguei o caminho dos fundos. “O que será que deu errado? Como foi que esse homem me viu?”, Isaura deve ter pensado.
Eu queria continuar olhando para Isaura e captar mais detalhes daquela cena agridoce e expressiva como uma fotografia de Sebastião Salgado. Mas senti que estava invadindo seu esconderijo e sua hora de almoço. Não tinha esse direito. Desviei meu olhar também e fui embora.
Só que Isaura montou um quiosque dentro da minha cabeça. Olho para ela. Chamo Isaura para tomar um café nas poltronas de plástico. Ela continua com a cabeça enfiada no celular. Ameaço escrever um textão que irá deixá-la visível ao mundo inteiro. Ela pede que lhe enviasse o textão pelo whatsapp.