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Copo de requeijão

24/04/2003 by in category Prosa tagged as , , , with 0 and 0

Nove tiros. Ninguém quer sentar do lado da mulher melancia. A menina liga a webcan. Também hesito. Abundadela invadiu duas poltronas. São três adolescentes no youtube: “Hoje vamos contar uma coisa que todos fazemos e ninguém tem coragem de admitir”.

A ambulância chega no local. O rapaz morto ainda está vivo. Sento do lado da mulher melancia. Sorrio. As adolescentes fazem suspense. Repetem o assunto do programa: “Hoje vamos contar uma coisa que todos fazemos e ninguém tem coragem de admitir”.

O rapaz baleado não sabe morrer. Sente medo e segura na mão do enfermeiro dentro da ambulância. O ônibus entra no túnel. A mulher melancia fecha os olhos e sonha com a dieta de pepinos que irá transformá-la numa azeitona. O enfermeiro puxa a mão e explica para o rapaz baleado: “Sou pago para ser enfermeiro, não para ser humano”.

Desço do ônibus baleado pela falta de solidariedade, minha inclusive. As três adolescentes admitem, envergonhadíssimas, que bebem água em copo de requeijão.

© 2024 · Marcelo Ferrari