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Amar é burrice

26/04/2003 by in category Prosa, Vídeos tagged as , with 0 and 0

Você ama alguém? Desculpaí, mas você é muito burro! Você ama de verdade? Do fundo do coração? Então, você é um completo idiota. Não importa se você ama seu pai, sua mãe, seu marido, sua mulher, seu filho, Jesus ou a humanidade, você é burro do mesmo jeito.

Quer ver só? Se você ama, você perdoa. Quer burrice maior do que essa? A pessoa pinta e borda, sapateia e caga na sua cara, e você, emburricado de amor, ainda oferece a outra face. Me diga: Qual a lógica disso?

Outro exemplo, se você ama, você trabalha de graça. Por amor ao ofício, faz todo sacro-ofício, tipo Dalai-Lama, Gandhi, Madre Teresa. Nem preciso citar com celebridades: qualquer pai de família anônimo que trabalhe de chofer pros filhos já serve de exemplo. Ora, se trabalhar de graça não é burrice, é ao menos injusto. Não acha?

Quer mais exemplos? Se você ama de fato, você aceita o outro como ele é. Aí a coisa já fica irracional mesmo. A pessoa tem bafo de cinzeiro, barba feita com saliva, coça o saco, fala mal da sua família, come de boca aberta, e você, amante, sempre com cara de Ronald McDonald’s: sou palhaço e amo muito tudo isto! Só estando completamente fora do juízo para fazer uma coisa dessas. Concorda?

E tem mais! Amar, além de burrice, é indigesto. Se você ama, aposto que já deve ter engolido muitos sapos, ciúmes, dores-de-cotovelo, orgulhos, comidas sem tempero, dívidas de cerveja e o diabo. Assim, se você ama, além de burro, deve ter um estômago de avestruz.

Agora, a pior notícia não é que amar é burrice, afinal com o tempo a gente cria uma maneira de conviver com essa gripe. A pior notícia é que, segundo algumas tradições religiosas, o verdadeiro amor é um vírus que nunca morre. Ou seja, se você ama, além de burro, está eternamente fodido.

Sua única salvação – aliás, nossa, pois também sou vírus positivo – é a esperança de que todas as ciências e filosofias da razão pura estejam completamente apaixonadas por si mesmas, e, sendo assim, o amor não emburreça, mas o raciocínio que se torne burro para quem entende o amor.

© 2024 · Marcelo Ferrari